O acesso à cidade como um direito humano e necessidade de transparência nas tomadas de decisão foram dois dos pontos mencionados por Alain Grimard - oficial sênior do Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU-Habitat) – que, aliados à tecnologia, devem ser levados em consideração nas discussões sobre cidades inteligentes. “Temos ressaltado a necessidade de uma abordagem mais holísticas sobre a inteligência das cidades – a governança deve ser inteligente, o planejamento deve ser inteligente, a participação social deve ser inteligente e também a infraestrutura deve ser inteligente”, disse.
A apresentação de Grimard na noite desta quarta-feira (12/2) para lideranças profissionais da área tecnológica compôs a programação do lançamento da 77ª Semana Oficial da Engenharia e da Agronomia (Soea), realizado durante o 9º Encontro de Líderes Representantes do Sistema Confea/Crea e Mútua, evento que segue até sexta-feira, 14/2, em Brasília, DF. Já a 77ª Soea, será realizada de 2 a 5 de agosto, em Goiânia.
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Em 2020, o tema da Semana Oficial da Engenharia e da Agronomia será “Cidades: Tecnologia e Sustentabilidade”. Minutos antes de receber o palestrante desta quarta-feira, o presidente do Confea, eng. civ. Joel Krüger, explicou a escolha, recordando das calamidades que cidades como Belo Horizonte e São Paulo têm enfrentado após fortes chuvas. “Discutir cidades, inovação e tecnologia é fundamental para garantir a qualidade de vida das pessoas. E esse é o grande objetivo das nossas profissões, está no artigo 1º da Lei 5.194/1966. A maioria da população brasileira vive nas cidades, é fundamental fazermos essa discussão”, defendeu.
Em sua palestra, Grimard sustentou que o conceito de cidades inteligentes – smart cities – é importante, mas deve ser ampliado e agregar noções de direitos humanos, direito à cidade e transparência nas tomadas de decisões, que auxiliem na resolução dos diversos problemas sociais dos espaços urbanos. “Para o ONU-Habitat, cidade inteligente puramente tecnocentrada não será realmente inteligente. Uma cidade ser inteligente também significada ser focada nas pessoas e na sustentabilidade em suas três dimensões: social, econômica e ambiental”. De acordo com dados apresentados por Grimard, 90% da população brasileira vive em áreas urbanas.
Possibilidades de cooperação
Como ponto positivo, Grimard avalia que o Brasil dispõe de conhecimento, tecnologia e recursos humanos para realizar essa construção. “E o Confea e os 27 Creas são veículos exemplares ideais para fazer avançar as experiências práticas e construir melhor o conhecimento”, disse, antes de mencionar as três grandes frentes em que enxerga possibilidade de parceria entre ONU-Habitat e sistema profissional: planejamento, big data e mobilidade.
Planejamento
Os municípios brasileiros são obrigados por lei a fazerem seus planos diretores. “Mas, infelizmente, até 2015, apenas 50% dos municípios cumpriam essa determinação”, apresentou. “As grandes cidades têm competência, recursos humanos, para planejar adequadamente, mas muitos municípios no Brasil não conseguem criar seu plano diretor, que poderiam ajudar muito no desenvolvimento sustentável urbano”. De acordo com Grimard, planos diretores são fundamentais para solucionar problemas de drenagem e esgoto, por exemplo. O oficial do ONU-Habitat mencionou, ainda, outros instrumentos de planejamento – Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS), terrenos e planos parciais, outorga onerosa do direito de construir – e ressaltou: “mas, antes de tudo, deve se reconhecer que há desigualdade e carência na realidade urbana”.
Big data
Em sua explanação, Grimard defendeu que a tecnologia da informação e uso inteligente de dados podem ser cruciais na definição das prioridades das políticas públicas. Informações demográficas, mapeamento, apontamento das características dos equipamentos públicos e monitoramento dos serviços públicos pela população foram alguns exemplos mencionados. “Se se organizam as informações sobre as sinalizações das vias, esgotamento sanitário, coleta de lixo e limpeza urbana, fica mais fácil direcionar, especializar e planejar as ações necessárias”.
Mobilidade
De acordo com Grimard, a rede rodoviária do Brasil cresceu 172% entre 1992 e 2014. “Isso não é sustentável, tanto do ponto de vista de trânsito, como de poluição”, avaliou. “A mobilidade tem que ter sua eficiência maximizada e os engenheiros são essenciais nessa construção”, disse, antes de citar uma frase dita por Enrique Peñalosa, ex-prefeito de Bogotá, segundo quem “uma cidade desenvolvida não é o lugar onde as pessoas pobres têm carros, mas onde os ricos utilizam transporte público”.
O lançamento da 77ª Semana Oficial da Engenharia e da Agronomia, realizado na noite desta quarta-feira, 12/2, em Brasília, DF, foi transmitido ao vivo. Veja a íntegra do evento:
Grimard encerrou sua apresentação ressaltando que o ONU-Habitat e o Sistema Confea/Crea e Mútua compartilham os mesmos parceiros: governos locais e estaduais, universidades e sociedade civil. “Podemos cooperar na implementação de projetos e dos planos diretores, com intercâmbio sobre melhores práticas e por meio de participação e realização de eventos, prêmios e campanhas globais”, disse. “O Brasil é um país muito urbanizado. O que precisamos não é aumentar a quantidade de espaço urbano, mas, sim, aprimorar sua qualidade. Obviamente, os engenheiros têm um papel importantíssimo no aumento da qualidade de vida e sustentabilidade das cidades”.
Beatriz Craveiro
Equipe de Comunicação do Confea
Fotos: André Almeida, Edinaldo Rufino e Marck Castro