Por uma lógica social-democrata

Brasília, 13 de março de 2006

"Lessa: a saída é uma verdadeira social-democracia"
Pensar o Brasil e o futuro da nação seria pensar um projeto de investimentos com foco em alcançar uma verdadeira social-democracia. Esta é a visão do economista e ex-presidente do BNDES, Carlos Lessa. Ele apresentou suas idéias durante o II Encontro Nacional de Lideranças do Sistema Confea/Crea, no Hotel Nacional, em Brasília.

Carlos Lessa, personagem presente no debate intelectual, acadêmico e político brasileiro, fez sua explanação em torno do tema “Uma Visão de Futuro Para o Brasil”. “Se eu tivesse que eleger um projeto para o país, teria que me utilizar do sonho. Acho que precisamos repensar a República. Esse termo implica harmonia entre nação, povo e território, e isso não existe hoje. O sonho a realizar é o da inclusão, e não o do mercado, de quem nos tornamos reféns”, analisou.

Lessa se valeu da Constituição Federal para defender a social-democracia como o verdadeiro ideário a ser atingido pelas políticas econômicas e sociais. Se mostrou esperançoso, embora enérgico quanto ao que chamou de desmandos dos governos, principalmente na década de 90, a qual apelidou, ironicamente, de fernandodécada.

Ao falar sobre economia e futuro, Lessa fez um apanhado geral sobre alguns dos temas mais relevantes da agenda nacional. Leia os principais pontos:

Previdência Social
Não haveria o tal déficit da previdência, se o dinheiro não tivesse sido desviado para o buraco negro do superávit fiscal primário usado para pagar juros da dívida. O pacto republicano remonta à idéia de solidariedade que só a seguridade social pode trazer. O dinheiro tem de ser usado para dar qualidade de vida a quem não pode produzir.

Educação
A política de educação não pode ser defendida com visão economicista. O sonho do mestre é que o discípulo supere o professor. É, por si só, uma visão de futuro. E futuro, a gente não tem direito de negar a ninguém.

Políticas públicas
Não vejo outra forma de garantir inclusão social senão pelos investimentos em educação, saúde, seguridade social, entre outros. Social democracia se faz com esses bem públicos intangíveis.

Desigualdade
Temos uma herança maldita e hoje estamos estagnados. A estagnação degrada a sociedade e destrói as estruturas de crescimento. O engenheiro, por exemplo, perde seu ofício. O jovem, seu futuro. E nada destrói mais uma sociedade do que tirar da juventude sua perspectiva de futuro.

Brasileiros no exterior
Temos mais de 150 mil brasileiros diplomados trabalhando no exterior. É para atender em Miami que o médico brasileiro passa quase uma década nos bancos da universidade pagos com dinheiro público? Nosso patrimônio intelectual está sendo exportado e isso me preocupa muito. No ano que vem, a receita de dinheiro enviado por brasileiros que moram fora chegará a R$ 9 bilhões.

Crescimento
Pode um país crescer derivado do mercado? Creio que não. É claro que, se as pessoas melhorarem suas rendas, vão comprar mais coisas. Só que não há máquina que sustente o crescimento. Não é possível crescer sem investimento e a população, com dívidas. Não é o mercado que cria o investimento. É exatamente o contrário.

Pensar o Brasil
Um projeto não é abstração. É programa de investimentos para atingir a República desejada. Por que não temos uma política urbana mínima de prestação de serviços? Porque não somos uma sociedade verdadeiramente solidária.

Setor privado
As empresas precisam de um horizonte em expansão para investir. Algumas grandes empresas brasileiras produzem mais fora do país do que no nosso território. A Gerdau faz mais aço lá fora do que aqui. Isso porque o Brasil cresce muito pouco.

Energia
O Brasil tem excepcional situação energética, mas ainda não sabemos aplicá-la bem. Temos três macrossistemas hidrográficos, a terceira reserva de urânio do mundo e a bioenergia que vai, provavelmente, desbancar os combustíveis fósseis. Não é só o Bush que se interessa pela nossa energia renovável. Haverá fila de países para comprar. Precisamos saber negociar isso.

Logística
Nossa infra-estrutura logística é de péssima qualidade porque fomos colônia e só aprendemos a criar caminhos para exportar. Usar rodovias para transporte pesado de cargas é um absurdo. Porque não explorar mais as ferrovias? Para desperdiçar energia e matar mais de 50 mil pessoas por ano nas estradas? É preciso fazer uma cirurgia plástica na logística nacional e só vocês, engenheiros, podem operar esse sistema.

Sandro Farias
Equipe de comunicação do Confea