Desigualdade e diversidade no mosaico brasileiro

Brasília, 13 de março de 2007

"Tânia Bacelar aborda desigualdades regionais"
A desigualdade social é o maior problema brasileiro. É o inimigo público número 1. A afirmação categórica é da economista e professora da Universidade Federal de Pernambuco, Tânia Bacelar. A professora falou sobre desenvolvimento, integração e ocupação do Brasil durante o II Encontro Nacional de Lideranças do Sistema Confea/Crea, que segue em Brasília até a próxima sexta-feira, 16 de março.

Convidada para falar sobre as desigualdades regionais no país, Tânia Bacelar fez uma análise crítica sobre o processo de desenvolvimento do Brasil. A partir de um olhar histórico, valeu-se de indicadores de ocupação territorial, renda per capita, escolaridade e índices demográficos para afirmar que, na prática, nos dividimos em “dois Brasis”. “Nós geramos uma sociedade fraturada, em um país ainda em processo de ocupação mais de 500 anos depois de sua suposta descoberta”, afirmou.

Tânia utilizou-se de mapas de diferentes fontes (IBGE, governo federal e cientistas sociais) para provar a tese de que a desigualdade vem desde a forma como o país foi ocupado. Os mapas mostram, por exemplo, que há uma linha clara de ocupação da faixa litorânea, com quase todas as grandes cidades espalhadas pelo litoral. Outra ilustração mostra a separação do país no tocante à pobreza, falta de escolaridade e baixo Índice de Desenvolvimento Humano. Em análise macro-regional, o Centro-Sul é, geralmente, favorecido. “Isto vem de uma herança do processo de ocupação espacial e social. E, ainda hoje, a desigualdade não se diferencia espacialmente; ela se reproduz em todas as escalas em estudo”, explicou Tânia.

"Bacelar mostra o grande mosaico chamado Brasil"
Mais do que dois Brasis
Quando a análise salta para o estudo de microrregiões, o conceito de desigualdade se espalha, unindo estados ricos e pobres em torno de problemas semelhantes. Segundo Tânia Bacelar, nas últimas décadas do século XX, houve uma dinamização da desigualdade social. “O Nordeste, o Norte, o Centro-Oeste, o Sudeste e o Sul formam um mosaico. O Brasil é um grande mosaico. Não dá para fazer análise do país só pelas macro-regiões. A desigualdade está presente de maneira até mais intensa nas regiões mais desenvolvidas”, observou.

Confira, abaixo, os principais pontos da exposição de Tânia Bacelar:

Diversidade
Ao contrário da desigualdade, a diversidade brasileira é nosso grande patrimônio. O problema é que, a partir do século passado, a desigualdade domou a diversidade. Os paulistas, por exemplo, têm dificuldade em assimilar isso. Em vez de pensar o Brasil, São Paulo se pensa como o próprio Brasil. É verdade que neste estado está concentrada metade da produção industrial brasileira. Mas nós não vivemos só de produção e comércio.

Povo
O povo brasileiro se espalha por vários biomas, ecossistemas e diversos berços culturais. Somos miscigenados, com visões de mundo e patrimônios históricos diversos. Mas a diversidade étnica ainda é pouco valorizada no Brasil. Este aspecto nacional pode ser desenvolvido, inclusive, sob o ponto de vista econômico.

Meio Rural
Quando decidimos ser um país urbano e industrial, supervalorizamos esse traço brasileiro. Nossa população é 80% urbana e, no imaginário nacional, somos 100% urbanos. Só que 80% dos municípios têm menos de 30 mil habitantes. Ser urbano é um traço edificante hoje em dia. Ninguém quer ser rural, o que é um grande erro. Já morei em país industrializado onde o meio rural e seu estilo de vida eram valorizados e subsidiados, até porque é de lá que vêm os recursos naturais.

Elite
O projeto da elite brasileira é engatar o Brasil moderno no Primeiro Mundo, e o resto do país que se dane. O projeto desde os anos 90 é identificar os pólos produtivos e ligá-los por meio de estradas e hidrovias, e daí para o mundo, pelo potencial exportador do Brasil.

Pensar o Brasil
Nosso desafio seria pensar o Brasil inteiro como uma grande heterogeneidade. Devemos ter o objetivo não de engatar o Brasil ao mundo, mas de pensar o desenvolvimento interno a longo prazo. É preciso trabalhar sobretudo com articulação subregional. Basta analisar o mapa do Brasil detidamente para ver: atenção, o Nordeste não é só problema! O Sudeste não é só riqueza!

Governo
Já está provado que esperar tudo do Governo Federal é errado. No jogo social, todos os atores são importantes. Nesse ponto, acho que evoluímos bastante.

Desafios
Penso que temos dois desafios imediatos. O primeiro é combinar políticas nacionais, de caráter descentralizador e democratizante, com políticas específicas de desenvolvimento em bases territoriais. Para dar conta da diversidade, é preciso uma política particular. A segunda proposta é dar uso a fatores mal utilizados no Brasil. Não precisa desmatar para aproveitar o que já tem. Onde está a terra improdutiva? Há desempregados e subempregados com qualificação. Onde alocá-los? Estas são questões a responder.

Sandro Farias
Equipe de comunicação do Confea