Cidades deficientes: cidadão corre perigo de vida

Maceió (AL), 21 de agosto de 2003

Deficientes são nossas cidades! O desabafo é do especialista em acessibilidade do Centro de Estudos Superior de Maceió (Cesmac), Daniel Andrade, feito na manhã de hoje durante a Fiscalização Preventiva Integrada (FPI). A iniciativa verificou especificamente condições de acessibilidade de uma das principais vias da cidade de Maceió, a avenida Gustavo Paiva, endereço de shopings, igrejas, indústrias, supermercados, lojas de carro e alguns órgãos públicos. A via tem trânsito intenso. A fiscalização fez parte da programação da 63ª Semana Oficial da Engenharia, da Arquitetura e da Agronomia (SOEEA).

Daniel Andrade integrou um grupo de 20 especialistas de órgãos municipais, duas escolas de arquitetura e urbanismo, entidades de deficientes físicos, Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB-AL) e dos Creas de Alagoas, Bahia e Minas Gerais. Eles se dividiram em dois grupos. Saíram do Centro de Atendimento ao Cidadão (CAC). Um percorreu a avenida Gustavo Paiva e o outro a avenida Dona Constança. Um trajeto de cerca de dois quilômetros.

No próprio local de partida, a arquiteta Nímia Braga Duarte, da Secretaria Municipal de Transporte e Trânsito, detectou várias irregularidades. À frente da sede do CAC: uma corrente com blocos baixos de concreto reduz o espaço do pedestre e o deixa numa situação de insegurança próximo à pista; a mesma corrente fecha o estacionamento para deficiente físico; e os postes de concreto impedem o acesso à rampa.

Em frente ao Centro: uma área comercial com produto exposto na calçada, grande parte dela rebaixada e usada como estacionamento, somam 50%, numa quadra só, de espaço irregularmente ocupado, o que obriga o pedestre a caminhar na rua. Ao lado dessa área comercial, um edifício que tem à frente duas lixeiras que tomam 30% do espaço do pedestre. E o que sobra para ele tem revestimento e nivelamento totalmente irregulares. Há dez metros do CAC, uma banca de camelô e um poste também tomam conta da área de pedestres.

E o detalhe mais importante, ou melhor, mais perigoso, está no semáforo bem próximo ao Centro, no cruzamento da Gustavo Paiva com a Governador Afrânio Lages: não existe pista demarcada para a travessia do pedestre, obrigando-o a correr entre os carros.

Sentindo na pele – Se para o pedestre comum está difícil, imagina para os que têm dificuldade de mobilidade. A deficiência da cidade de Maceió, verificada na saída da fiscalização e que os especialistas garantem ser comum em muitas cidades brasileiras, foram se repetindo e se somando a outras no percurso. Os representes da Associação de cegos de Maceió, Marcionilda Verçosa do Rego e Marcos Antônio Silva de Paula acompanharam todo o trajeto.

Marcionilda diz que para ela a ação é mais um reconhecimento das dificuldades que uma fiscalização. Porém, “muito importante porque estamos acompanhados de especialistas que esperamos, ao constatarem nossas dificuldades de transitar numa cidade assim, ajudem na solução do problema. “Até porque o discurso da moda é de inclusão, então queremos ser incluídos na cidade”, provoca.

Para Marcos de Paula, Maceió é o retrato das cidades brasileiras que cresceram sem planejamento urbano, “onde toda mobilidade é muito difícil”, diz. Mas ele acredita em iniciativas como a FPI: “Essa ação é muito positiva. Dá esperança de um dia termos uma cidade com mais igualdade de condições de mobilidade para todos”. A Associação que eles representam têm 300 participantes.

Essa é a segunda FPI da Acessibilidade, coordenada pelo Crea-AL. A primeira ocorreu no início de agosto no Viaduto Washington Luis. O grupo comemora que algumas das irregularidades detectadas foram resolvidas na tarde do mesmo dia, como os blocos de concreto que fechavam parte da calçada de acesso ao viaduto.

Ao final do percurso o coordenador da FPI, Jackson Cabral, disse vários impedimentos de acessibilidade foram encontrados, principalmente, para os portadores de deficiência física. Entre eles: inexistência de rampa em prédios, rampas irregulares, meio fios da mesma forma, acesso para deficientes de supermercado 24 horas fechado, calçadas transformadas em estacionamento, lama de esgoto tornando a rua escorregadia, restos de suporte de placas de publicidade e suportes de ferro no meio da calçada, ausência de sinalização de estacionamento e de via de pedestre, calçadas altas e outras esburacadas, paradas de ônibus acima da altura regular.

Na próxima terça-feira os participantes da FPI vão se reunir. Cada um vai apresentar seu relatório. Jackson Cabral compilará todos e um relatório final será encaminhado ao Ministério Público e todos os outros órgãos competentes para as possíveis soluções. É importante ressaltar que estas soluções já serão sugeridas no próprio relatório.

Bety Rita Ramos
Equipe de Comunicação do Confea