Especialista afirma que bem histórico deve ter valor de venda aumentado

São Luís (MA), terça-feira, 30 de novembro de 2004.

Sérgio Seiffert

 
Engenheira e doutora Maria dos Anjos Ramos veio de Portugal para realizar, pela primeira vez no Brasil, um curso sobre avaliação de patrimônio histórico e defende critérios justos de definição de preço tanto para o proprietário quanto para o comprador, em geral o Estado. Evento acontece em São Luís, na Semana Nacional de Engenharia

São Luís (MA) - A classificação de um bem imóvel como de interesse especial ou histórico, diferente do que pensam muitos proprietários desses patrimônios, não diminui seu valor no mercado imobiliário. "Ao contrário, aumenta o seu valor e o proprietário não pode, de maneira alguma, ser prejudicado pelo fato de possuir algo a que a sociedade atribui um valor especial devido à idade, raridade, simbologia e qualidade". A afirmação é da engenheira civil portuguesa e doutora pela Universidade Politécnica de Valência (Espanha), Maria dos Anjos Ramos, que ministra, pela primeira vez no Brasil, um curso sobre avaliação de patrimônio histórico. O curso acontece em São Luis (MA) nesta quarta e quinta durante a Semana Oficial de Engenharia, Arquitetura e Agronomia, que reúne mais de 2 mil profissionais de todo País.

Segundo Maria dos Anjos, essa percepção equivocada de que um bem histórico perde valor de mercado dificulta a preservação. "Esse imóvel vai deixar de pertencer a uma pessoa e passará a ser de todos", ressalta a doutora e só isso já justifica uma avaliação econômica justa. "O mercado imobiliário, os engenheiros e arquitetos tem que fazer ver que o imóvel, por ser histórico, vale mais", afirma. Ela garante que a forma de caracterização de mercado desse tipo de bem, pelo comportamento da oferta e demanda, é idêntica às demais. "O que normalmente acontece é que geralmente nos deparamos com dois monopólios: um só vendedor e um só possível comprador", destaca. Ela lembra que normalmente, quando o bem é muito representativo e simbólico, o seu valor alcança números que fazem diminuir a quantidade de potenciais compradores.

Critérios justos - A professora portuguesa é uma especialista mundial no assunto e conhece bem vários sítios de patrimônio preservado no Brasil e sabe também que o governo, seja municipal, estadual ou federal é sempre o comprador em potencial desse tipo de bem. "Não havendo um mercado transparente, como se poderão fixar valores que satisfaçam as duas partes e se sejam seguidos critérios de avaliação justos?", questiona Maria dos Anjos. Esse é exatamente o principal aspecto do curso realizado em São Luis, onde são apresentadas as formas de avaliar corretamente os imóveis dessa natureza. Influenciam nesta avaliação variáveis como raridade (mundial, nacional, local, etc), quantidade de bens da mesma natureza existentes, interesse para a sociedade, alcance e os atributos do bem (artístico, estético, científico, social, político, religioso, cultural, etc). Maria dos Anjos observa que, no Brasil, de maneira geral, o governo valoriza por baixo, mas também há casos em que os proprietários cobram valores exagerados.

Decisão em colegiado - Como o Estado, no papel de guardião da memória e cultura coletiva, em geral arca com os recursos para a preservação do patrimônio, é preciso definir de maneira correta o que deve ser preservado. "Há o que pode e o que deve ser preservado. O ideal é preservar todo o bem que realmente tenha importância histórica e cultural, mas como os recursos são escassos, é preciso priorizar", afirma o professor Radegaz Nasser Júnior, vice-presidente do IBAPE (Instituto Brasileiro de Avaliação e Perícias em Engenharia). Em função disso, ele ressalta a importância fundamental das decisões sobre preservação do patrimônio histórico nacional serem tomadas de forma colegiada e após rigorosa avaliação. "Contudo, a eficácia destes trabalhos só se manifesta se houver um ato de cidadania generalizado, que dê valor à herança de nossos antepassados, fazendo disso um ato de comemoração permanente a sua memória", conclui Maria dos Anjos.

Róger Bitencourt - Fábrica de Comunicação