Mídia está nas mãos de políticos

Brasília, 1° de novembro de 2006

Em matéria veiculada nesta semana pela Agência Repórter Social, Alceu Castilho traça um panorama dos deputados e senadores que possuem alguma participação em concessões de rádio e TV. Apesar da prática ser ilegal, 27 senadores (1/3 do total) e 53 deputados (mais de 10% da câmara) possuem algum tipo de participação comprovada nesse tipo de atividade.
O texto é baseado em dados levantados pelo Instituto de Estudos e Pesquisas em Comunicação (Epcom), do RS, e pelo professor Venício de Lima, pesquisador do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política (NEMP) da Universidade de Brasília. Além disso, declarações dos próprios políticos aos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) também foram utilizadas para complementar o estudo.

O artigo 54 da Constituição veta a participação de políticos eleitos em concessões públicas de comunicação. Não é o bastante que o homem público se afaste das funções de chefia de seu veículo quando eleito, uma vez que a lei proíbe qualquer “proprietário ou diretor” de um desses meios de comunicação a concorrer a um cargo público. Nesse contexto, a propriedade de uma concessão de rádio ou TV não é um bem adquirido por um empresário, mas sim um direito que o Estado compartilha com seus cidadãos.

Apesar disso, o uso desse poder como moeda de troca política é prática corrente no Brasil desde o surgimento das primeiras emissoras de rádio. Até a Constituição de 88, a autoridade para outorgar essas concessões recaía apenas sobre o poder executivo. Esses poderes foram repartidos com o legislativo nacional pela carta de 88 e desde então as decisões do governo central sobre esse assunto devem ser aprovadas pelo Congresso Nacional.

Longe de banir o uso dessas concessões como barganha política, a resolução possibilitou que os parlamentares legislassem sobre o tema. Deputados e senadores conseguiram ampliar de forma significativa seu poder sobre as regiões em que já possuíam sua base de sustentação política. Venício de Lima cunhou a expressão “coronelismo eletrônico” para designar essa nova estratégia de sustentação das oligarquias políticas dominantes.

O professor alerta para os riscos de um sistema onde tem-se “o poder concedente se confundindo com o beneficiário da concessão. As oligarquias estão representadas no congresso”, afirma. Essa situação chegou a um nível tão óbvio que Hélio Costa, Ministro das Comunicações, era concessionário de uma rádio enquanto exercia mandato no Senado e só deixou de ser ao assumir o Ministério.

A região do Brasil que apresenta o maior número de parlamentares concessionários é o nordeste, com 44 senadores e deputados donos de emissoras. O sudeste é o segundo, com 18, seguido pela região Sul, com oito, pela norte, com sete e pela centro-oeste, onde dois senadores e um deputado exercem a prática ilegal.

Representação - No final do ano passado, o Instituto Para o Desenvolvimento do Jornalismo (Projor), que é a entidade jurídica que mantém o Observatório da Imprensa (OI), entrou com um representação junto ao Ministério Público Federal denunciando essa condição de grande parte do legislativo brasileiro.

Luiz Egypto, editor-chefe do Observatório, disse que o órgão sempre criticou parlamentares concessionários e que em determinado momento o grupo decidiu que apenas escrever sobre isso não seria o suficiente. O veículo e Venício Lima, também colaborador do OI, promoveram então uma pesquisa que mostrou a “promiscuidade entre parlamentares concessionários e responsáveis pela renovação e concessões dessas outorgas”, disse Egypto.

A pesquisa mapeou o quadro desses parlamentares e identificou dois - Corauci Sobrinho, (PFL-SP) e Nelson Proença (PPS-RS) – que estavam legislando em causa própria sobre assuntos que tinham interesses diretos. A representação está hoje com o Ministério Público Federal (MPF) que pediu informações ao Ministério das Comunicações e julgou o relatório apresentado insuficiente. O Ministério requereu novas informações ao órgão.

Caso o MPF entenda que existe ilegalidade, vai abrir processo legal para a punição dos envolvidos, que pode chegar até à perda do mandato. “Estamos menos preocupados em punir deputados do que em escancarar uma situação que todos sabemos que é ilegal. Trata-se de questionar de forma mais consistente possível um procedimento de canais públicos”, afirmou Egypto.

Fonte: www.comunique-se.com.br