Brasília, 18 de abril de 2024
A primeira faísca veio justamente de uma caixa de fósforo que, em vez dos palitos, continha um bilhete. Era o início da década de 1950, e o engenheiro Joffre Mozart Parada sobrevoava baixo, em um avião, a casa-sede de uma das fazendas que um dia viria a ser Brasília. O bilhete que jogou do alto pedia um encontro no cartório de Luziânia para iniciar as negociações da desapropriação das terras.
Essa história foi contada na Revista Esso, em edição até hoje procurada por Thelma Parada, filha de Joffre, que guarda coleção orgulhosa do trabalho do pai. Conhecido por ter sido o primeiro engenheiro a pisar em Brasília, foi Joffre o responsável por, em 1955, definir o marco zero da capital. Ele também demarcou a estrutura e foi prefeito do que hoje é o Núcleo Bandeirante, assinou o projeto de urbanização do Gama, trabalhou na Comissão de Cooperação para a Mudança da Capital Federal e fez o levantamento das áreas de cada fazenda que foi assentada para ser desapropriada para que hoje vigorasse a capital federal. “A mamãe falava que a rival dela era Brasília”, brinca Thelma, antes de explicar que, na verdade, a mãe, Mercedes, atuava como secretária-executiva de Joffre.
Thelma formou-se engenheira civil, mas não por exigência do pai. Ele, na verdade, pouco contava sobre suas conquistas profissionais em casa. “Ele nunca falou nada disso para a gente. Passávamos no buraco do tatu, pedíamos a ele que buzinasse porque dava eco, ele dava um sorriso, e somente. Ele não aparecia nem em fotografia de tão tímido. Ele era muito discreto. Quando ele faleceu, o jornalista Adirson Vasconcelos escreveu matéria no Correio Braziliense e o colocou como ‘o primeiro engenheiro a chegar’. Foi aí que fui entender a dimensão. Eu tinha 21 anos. Minhas irmãs, 20. Foi em 1976, faltavam nove dias para ele completar 52 anos. Não se falava muito nos pioneiros. Não havia essa preocupação com a história”. É de Joffre, por exemplo, em coautoria com o engenheiro Janusz Gerulewicz, o mapa “Novo Distrito Federal – Planta índice cadastral” –, que criou condições para que os proprietários obtivessem suas escrituras.
Neste aniversário de Brasília, Thelma acredita que seu pai não estaria satisfeito com a cidade hoje. “Já naquela época, ele se irritava com as mudanças, os novos viadutos...”, ri, “normal, né, quando mexem no projeto da gente”. Thelma aproveitou para compartilhar um pouco de sua experiência como brasiliense. Nascida em Goiânia, mora na capital federal desde antes de completar dois anos. “A gente conhecia todos, era uma vida bem tranquila, segurança boa, a porta de casa aberta, ficávamos ali brincando, namorando, sempre com muita liberdade, sem nenhuma preocupação. A gente não conhecia perigo. Era só alegria e despreocupação. Agora a cidade grande, o trânsito hoje me assusta um pouco, a cidade continua crescendo e a gente sem soluções melhores, e a gente perdendo tempo para voltar para a casa, além da insegurança que a gente tem. Mas, a gente se organizando, tudo dá certo. Daqui não saio, não. A raiz vai ficando cada vez mais profunda”.
Além da questão da segurança, o que deixa Thelma mais chateada é o estigma. “A fama de ser o lugar onde se ganha dinheiro com facilidade me entristece um pouco. Temos que ir contra essas pessoas que dizem que aqui só tem corruptos, os corruptos vêm de fora. Nós somos pessoas normais, honestas e trabalhadoras, gente do bem e que mora aqui. É uma cidade bonita, é a cidade de que eu gosto”.
Beatriz Craveiro com informações do Livro do Mérito
Equipe de Comunicação do Confea
Fotos: Acervo pessoal Thelma Parada