Brasília, terça-feira, 23 de setembro de 2003. Muito proveitosa. Assim pode ser definida a reunião entre os engenheiros e arquitetos de Brasília e o Primeiro Ministro de Senegal e seus assessores, realizada ontem (22/09) das 19h00 às 23h00, no plenário do Confea, para trocar experiências sobre a construção da capital brasileira com o objetivo de aproveitá-las para a nova capital daquele país, que será erguida em breve. O debate foi uma promoção do Clube de Engenharia com apoio do Crea-DF e do Confea. Os motivos que levaram à construção de Brasília são diferentes dos que alimentam hoje a idéia de uma nova Dakar no Ministério de Urbanismo de Senegal. Brasília visou a interiorização do desenvolvimento do país e a nova capital de Senegal objetiva resolver problemas como concentração humana, industrial, trânsito caótico, péssimo saneamento básico e outras situações que somam para uma baixa qualidade de vida da população.Senegal hoje tem 10,2 milhões de habitantes, dos quais um terço está concentrado na capital, que tem uma área de somente 0,3% dos 200 mil km2 do país. Essa total falta de compatibilidade entre espaço e quantidade da população é uma das grandes preocupações do governo."Para solucionar o problema, vários caminhos foram explorados e a solução unânime é a transferencia da capital para uma nova cidade", disse o Primeiro Ministro de Urbanismo de Senegal, engº civil Seydon Sy Sall. Ele reconhece que é difícil transferir as atividades econômicas e a decisão é partir para o deslocamento somente das atividades políticas e administrativas."O local já está escolhido e os limites também já estão definidos. A idéia é construir a capital em uma região virgem, próxima do mar. Agora surgiu o problema de como achar financiamento para saneamento, água e energia da nova capital", desabafou o Ministro, ressaltando que neste momento estão sendo examinadas as experiências de outros países e que a brasileira chamou atenção por ter sido pioneira, aberta e positiva. "Claro que Senegal vai construir uma capital a altura do seu desenvolvimento econômico. Vocês recebem dois milhões de habitantes e nós pensamos em receber somente 250 mil", esclareceu Seydon Sy Sall, levantando vários questionamentos, entre eles: como foi feita a escolha do sítio no Brasil? Como foi elaborado o plano geral? De onde veio o financiamento? Como foi feita a infra-estrutura? Os prédios? Qual foi o papel do Estado? Do setor privado? Como foi e como é feita a gestão da terra? O público presente não poderia estar mais à altura para satisfazer a curiosidade explícita do grupo senegalês. Antes mesmo da manifestação do Primeiro Ministro, o arquiteto José Queiroz da Costa Filho, 1º vice-presidente do Confea e representante do Conselho na mesa, já havia colocado o Sistema profissional à disposição para todas as informações possíveis. E o eng. Kleber Farias Pinto, presidente do Conselho Deliberativo do Clube de Engenharia e Cônsul de Senegal, já havia feito uma breve, mas profunda, exposição sobre a construção de Brasília desde sua concepção.Kleber lembrou que a idéia de ocupar o interior do Brasil datava dos primórdios da independência do país. Porém só intensificada e, efetivamente, realizada pelo presidente Juscelino Kubitschek. "O compromisso de sua candidatura à Presidência da República foi construir a nova capital no tempo do seu mandato. O que parecia uma loucura, mas com sua determinação a idéia foi adotada pelo Congresso Nacional, que estipulou em Lei data para a inauguração de Brasília", recordou.Para Kleber, a experiência de Brasília é a melhor colaboração que o Brasil pode dar a Senegal, porque não há no mundo história similar de construção de uma cidade para 500 mil habitantes - população inicialmente prevista - em três anos e meio.Depoimentos e Sugestões - Kleber alertou que é fundamental a escolha geográfica do local, que tem que levar em conta condições futuras de qualidade de vida, como abastecimento de água, por exemplo. O eng. Sílvio Jaguaribe, que trabalhou na Novacap - empresa do governo criada para coordenar a execução da construção da cidade - falou sobre as desapropriações dos terrenos e as dificuldades encontradas. Ele destacou que é imprescindível ter uma companhia estatal e um presidente politicamente fortes.O arquiteto César Barner, membro do escritório de arquitetura de Oscar Niemeyer, recomendou que o projeto da nova capital seja confiado a técnicos e que os políticos não interfiram. Aconselhou também: "Evitem as edificações monumentais. Aqui construímos prédios extremamente bonitos, mas caros. Os prédios têm que ser funcionais e acessíveis".José Carlos Coutinho, representante da Escola de Arquitetura da UnB, disse que da construção de Brasília ficou claro que o dado mais previsível de um projeto de longo prazo é a imprevisibilidade. "Há uma série de fatos no plano social, econômico e tecnológico que são imprevisíveis", disse.José Galbinski, representante da Escola de Arquitetura do Uniceub, enfatizou que Brasília não é uma cidade planejada, mas sim projetada. E chamou atenção para o quê denominou de duas fases da construção de uma cidade: a conceitual e a de desenvolvimento planejado.O eng. eletricista, Argemiro José Cardoso, listou as grandes diferenças tecnológicas da época da construção da capital brasileira para os dias de hoje. Ele falou sobre a preocupação com os aspectos ecológicos e com a migração dos moradores das áreas mais pobres para a nova capital.A conselheira federal, arquiteta Maria Laís, sugeriu que Senegal deixe a cargo da União Internacional dos Arquitetos (UIA) o concurso para a escolha do projeto da nova capital, a exemplo do que foi feito no Brasil. Lembrou que o IAB tem 83 anos de tradição na organização de concursos de projetos.O arquiteto Luis Magalhães, que enfatizou estar se manifestando como cidadão, apontou pontos positivos em Brasília que poderiam ser levados em conta na construção da nova Dakar, como a amplidão da cidade que evita concentrações e os grandes espaços de área verde. Como pontos mais difíceis, destacou a questão do transporte e o conceito de superquadras, que na sua avaliação, criou pequenas ilhas dificultando o relacionamento entre as pessoas.O eng. Carlos Moura, presidente do Clube de Engenharia, agradeceu o apoio do Confea na viabilização do debate, lembrou pontos destacados nas várias opiniões expostas, ressaltando o objetivo da interiorização da capital e a criação de um pólo de desenvolvimento no Centro-Oeste.Moura aproveitou o oportunidade para divulgar o Congresso Mundial de Cidades Planejadas, que será realizado em Brasília, no próximo ano, com a discussão de experiências de mais de cem cidades planejadas. "Acredito que a participação de Senegal será oportuna", convidou.Também participaram do debate o geólogo Giácomo Liberatore, superitendente do Confea; o arquiteto Moraes de Castro, assessor da presidência; Alberto Alves de Faria, presidente do Crea-DF; a engª civil Maria de Nazareth de Souza França, conselheira federal e a engª eletricista Nilza Luiza Venturini Zampieri, também conselheira. Bety Rita Ramos - Da equipe da ACS
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