Engenheiro expõe falhas no projeto de transposição do "Velho Chico"

Porto Alegre, 31 de janeiro de 2005

 

Numa concorrida palestra, hoje pela manhã, no Fórum Social Mundial, o engenheiro eletricista Augusto César de Freitas Barros apontou os “pecados técnicos” no projeto do Governo Federal de transposição das águas do Rio São Francisco. Segundo ele, existe um lobby a favor, mas pouco consistente nos argumentos, enquanto há muitas ressalvas à idéia, como o fato de se pretender levar água para onde ela já existe: “A água vai sair da Bacia do Sobradinho, na Bahia, e vai para os maiores açudes e barragens do Nordeste”, afirmou o engenheiro. “Nossa preocupação é que estão levando para onde já tem água e isto é uma incoerência”, completou.

Outro problema, acrescentou Barros, é que a água transposta vai se destinar quase que exclusivamente à irrigação, para o agronegócio, apenas 5% para consumo humano e de animais. “No início se falava que era para matar a sede das pessoas e agora mudaram a concepção do projeto”, disse o engenheiro, que representa o sindicato profissional de seu Estado, o Rio Grande do Norte.

Por outro lado, continuou, o projeto retira água de onde ela já está quase faltando, pois na Bacia do Sobradinho 80% do volume total (1.860 metros cúbicos/s) está comprometido para geração de energia. Com o que já foi outorgado pela Agência Nacional de Águas (ANA) sobra uma vazão de apenas 26 metros cúbicos/s: “Estão tirando do rio a última gota d’água”, acrescentou.

O engenheiro disse que as falhas de concepção de projeto, como estas, estão apontadas nos estudos de vários especialistas. A melhor solução, apontam os mesmos especialistas citados pelo engenheiro, seria a revitalização do “Velho Chico”, com investimentos em saneamento, uso sustentável, combate ao desperdício, além de adutoras, que levem água das grandes barragens para as regiões realmente castigadas pela seca, e a construção de cisternas para as comunidades.

A palestra integrou o Seminário Água: bem comum, promovido pela Federação Nacional dos Engenheiros. No início da manhã, foi palestrante o engenheiro agrônomo Valter Antônio Becari, de São Paulo, que integra o Comitê das Bacias Hidrográficas do Piracicaba, Capiavari e Jundiaí. Segundo ele, a maior luta do comitê, hoje, é pela aprovação do pagamento do uso da água, incluindo indústria e agricultura, de onde poderiam vir os recursos necessários para investimento em saneamento, já que apenas 30% dos esgotos da região são tratados (62 municípios, mais de 4 milhões de habitantes).  “É o único jeito de conseguirmos os recursos necessários”, afirmou.

Ulisses Almeida Nene