Presidente da Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público (CTASP) da Câmara dos Deputados, a deputada federal Professora Marcivania (PCdoB/AP), propôs, nessa quinta-feira (31/10), a criação de um grupo de trabalho que reunisse representantes de diversas entidades profissionais com vistas a debater acerca da Resolução nº 51/2013 do Conselho de Arquitetura e Urbanismo. Ao dispor sobre áreas de atuação dos arquitetos e urbanistas, o normativo afetou cerca de 15 outras profissões.
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A proposta de criação de um grupo multidisciplinar foi feita – e acatada pelos presentes – durante audiência pública na CTASP, que reuniu lideranças profissionais em debate sobre o Projeto de Decreto Legislativo (PDC) nº 901/2018, que visa sustar os efeitos da Resolução nº 51. “A criação do grupo é uma tentativa de se ter um bom produto final [o PDC]. A lei está em constante transformação. Os contextos históricos mudam e a lei precisa se adaptar. Mas é preciso diálogo, principalmente em uma discussão que envolve tantas profissões”, afirmou Marcivania.
A primeira reunião do grupo será realizada no próximo 6 de novembro, às 10h, na Câmara dos Deputados. “Damos um prazo de 24 dias para os senhores entrarem em um acordo a respeito do tema. Findo o prazo, se não tivermos uma proposta, o PDC entra em votação”, afirmou o deputado federal Ricardo Izar (PP/SP), autor do projeto.
Na visão do vice-presidente do Confea, conselheiro federal eng. eletric. Edson Delgado, que representou o Conselho Federal durante a audiência pública, a Resolução nº 51 tentou impor uma hierarquia entre as profissões, de maneira que a coordenação de projetos fosse sempre, obrigatoriamente, feita por arquiteto. “O PDC não trata de desregulamentar a arquitetura. As atividades que os arquitetos exercem estão descritas na Lei nº 12.378/2010, e esse dispositivo ninguém aqui quer discutir”.
Delgado defendeu que sustar os efeitos da Resolução nº 51 é importante para respeitar os diversos profissionais que tiveram suas atividades violadas. “Para nós, engenheiros, a violação foi simbólica, porque o Confea vem garantindo o exercício de seus profissionais. Mas para outras profissões, que não possuem conselho, as ações do CAU foram contundentes, porque os profissionais sofreram com o poder de fiscalização e autuação do CAU”, explicou.
Entre essas profissões, está a de designer de interiores. Na audiência desta quinta-feira, quem representou o setor foi o consultor de relações governamentais da Associação Brasileira de Designers de Interiores (ABD), Heitor Zanini, que contou que a regulamentação da profissão de designer de interiores só entrou em pauta depois da criação do CAU. “Antes disso, em nenhum momento o Confea/Crea mexeu com nossas profissões. Agora tivemos de regulamentar a profissão para autorizar que nossos profissionais trabalhem”, comentou.
Em sua explanação, o presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo, Luciano Guimarães, fez um histórico da regulamentação da profissão de arquiteto. “Queremos convidar todas as profissões envolvidas para uma conversa técnica e harmonizar os entendimentos”, disse, antes de passar a palavra para a conselheira Patricia de Macedo, que, no CAU, coordena a Comissão Temporária de Harmonização do Exercício Profissional (CTHEP). Macedo explicou que o Plenário do CAU chegou a suspender itens da resolução controversos e questionados por outros conselhos e entidades profissionais. “É tempo de conciliar esses pontos, que podem ser resolvidos por meio de resolução conjunta. Esse debate precisa ser o mais amplo e urgente possível. São profissões que, em campo, trabalham em conjunto”.
A audiência pública foi requerida em setembro pelo deputado Orlando Silva (PCdoB/SP), que, na abertura da reunião, afirmou ser aquela uma oportunidade de colheita de impressões dos representantes de diversos setores da sociedade civil acerca de um tema polêmico. “Não quero apresentar um relato antes de fazer a oitiva”, afirmou.
O relator do texto na Comissão foi designado em maio – deputado Tiago Mitraud (Novo/MG) – e apresentou parecer – pela aprovação do PDC – em agosto. “Tenho defendido a liberdade da atuação profissional. Os conselhos fazem um papel importante na garantia do bom exercício da profissão, mas algumas vezes acabam passando um pouco do ponto e restringem a atuação dos outros profissionais. Dentro dos requisitos legais, meu ponto de vista sempre será em defesa da liberdade profissional”, manifestou-se Mitraud.
Também compuseram a mesa e fizeram apresentações durante a audiência a presidente da Associação Nacional de Paisagismo, Eliana Azevedo, e a presidente da Associação Brasileira de Arquitetos Paisagistas, Luciana Schenk.
A audiência foi transmitida ao vivo. Assista ao registro na íntegra.
Entenda
A profissão de arquiteto foi regulamentada pela primeira vez em 1933, quando da criação dos conselhos federal e regionais de Engenharia, Arquitetura e Agronomia, que deram origem ao Sistema Confea/Crea. Em dezembro 2010, sancionou-se a Lei nº 12.378, que, desvinculando os arquitetos do Sistema, criou o Conselho de Arquitetura e Urbanismo. Essa lei estabeleceu (Art. 3º, § 4º e 5º) que quando as normas de atribuição do CAU contradizerem normativos de outros conselhos profissionais, a controvérsia deve ser resolvida por meio de resolução conjunta. O Confea e outros conselhos profissionais alegam, no entanto, que não foram ouvidos quando da elaboração da Resolução nº 51, publicada em 2013.
De acordo com o conselheiro federal do Confea eng. civ. Marcos Camoeiras, o CAU tem autuado profissionais de Engenharia, buscado anular concurso público e barrado projetos em prefeituras, valendo-se da Resolução nº 51. “Queremos construir um caminho de harmonização. Mas sou testemunha dessa história. O CAU não senta conosco para criar a resolução conjunta”, afirmou, durante a audiência. Além de Camoeiras e Delgado, também estavam presentes os conselheiros federais eng. agr. Annibal Lacerda, eng. mec. Carlos de Laet, geol. Waldir Duarte Costa Filho e eng. prod. mec. Zerisson de Oliveira Neto.
Enfática, a presidente do Crea-DF, eng. civ. Fátima Có, afirmou entender que a questão está fácil de ser resolvida. “Vamos revogar”, defendeu. Na audiência, a engenheira colocou que, mais do que inconstitucional, a Resolução nº 51 é ilegal. “A resolução não pode falar que algo é privativo dos arquitetos quando trata de atividades exercidas por outras profissões. O texto atenta contra a própria lei de criação do CAU, que prevê o instrumento da resolução conjunta”. Também participaram da audiência os presidentes dos Creas de Sergipe e de Tocantins, respectivamente eng. agr. Arício Resende Silva e eng. civ. Marcelo Costa Maia.
Aplaudido durante sua fala, o presidente da Associação Brasileira de Engenheiros Civis (Abenc), eng. civ. Francisco Ladaga, manifestou preocupação com a palavra “privativa”, constante do texto. “Depois da Resolução nº 51, tivemos que entrar na justiça para poder trabalhar. Não queremos proibir, nem restringir o exercício profissional de ninguém. Só queremos que não nos proíbam de trabalhar dignamente. Se a lei nos dá esse direito, não é possível que uma resolução no restrinja”. Também estava presente o coordenador nacional das Câmaras Especializadas de Agronomia, eng. agr. Kleber Souza dos Santos.
Além do PDC 901/2018, também tramita na Câmara, a respeito do tema, o Projeto de Lei nº 9.818/2018, que exclui das atribuições do CAU a prerrogativa de definir áreas de atuação privativas dos arquitetos e urbanistas. O texto foi tema de audiência pública em dezembro do ano passado, que contou com participação de diversas lideranças do Sistema Confea/Crea. O assunto é uma das prioridades do Confea no Congresso Nacional. Em maio último, por exemplo, uma delegação de lideranças profissionais realizou ação parlamentar com foco no PL 9818/18 e no PDC 901/18.
Beatriz Craveiro
Equipe de Comunicação do Confea
Fotos: Marck Castro/Confea