Controle de gafanhotos exige receituário agronômico, alerta Confaeab

Brasília, 9 de julho de 2020.

Gafanhotos na Argentina (foto: Hector Medina – reprodução/Twitter)

“O receituário agronômico é instrumento de recomendação do profissional habilitado essencial tanto para eficácia no controle de pragas, como gafanhotos, quanto para a saúde ambiental. No contexto de epidemias e de ameaças à segurança alimentar, o documento é ainda mais necessário e deve ser emitido por profissional devidamente preparado, como é o caso do engenheiro agrônomo”. O alerta é do eng. agr. Kleber Santos, presidente da Confederação de Engenheiros Agrônomos do Brasil (Confaeab), ao comentar o controle da nuvem de gafanhotos que vem gerando danos a lavouras agrícolas argentinas desde maio e ameaça atingir plantações no Brasil. Em nota oficial divulgada nesta quinta-feira (9/7), a entidade nacional ligada ao Sistema Confea/Crea afirma acompanhar ações de combate ao problema que poderá chegar aos estados do Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina e Mato Grosso do Sul.

No documento, a diretoria da Confaeab informa que “apesar da existência de agrotóxicos com ingredientes ativos para controle de gafanhotos da espécie Schistocerca cancellata, há falta de produtos devidamente registrados para culturas da estação (videiras e outras frutíferas tais como pêssego, citros e ameixa; trigo; forrageiras de inverno como aveia e azevém; cevada; oliveiras; e ainda milho safrinha) que se encontram nas possíveis rotas de deslocamento da praga”. 

Neste caso, “é necessária a obtenção de registro ou autorização de uso em caráter emergencial de produtos comerciais com capacidade de controle, e uma aplicação devidamente acompanhada por corpo técnico, por meio do receituário agronômico, objetivando controlar os resíduos máximos toleráveis pelas diversas culturas, e também minimizar riscos ambientais e deriva nas aplicações”, argumenta a entidade. Outra precaução é o acompanhamento criterioso dos resíduos e averiguação do Limite Máximo de Resíduo (LMR) permitidos tanto para consumo no mercado interno como para o mercado exportador. 

Kleber Santos, eng. agr. presidente da Confaeab

A nota segue lembrando que o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) declarou estado de emergência fitossanitária no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina para permitir a implementação do Plano de Supressão da praga e adoção de medidas emergenciais. A portaria, publicada em 25 de junho, tem validade de um ano. Sobre essa medida, a Confaeab reforça que “qualquer produto químico, biológico ou microbiológico utilizado no controle de pragas deve ser recomendado por engenheiro agrônomo por meio do receituário agronômico”, como define o art. 13 da Lei 7.802/1989.

Na avaliação da entidade, essa estratégia traçada para o enfrentamento da praga é de relevante interesse público e, mesmo que os gafanhotos não cheguem ao país, a situação está permitindo ao Brasil, por meio do Ministério da Agricultura e organismos estaduais de Defesa Vegetal, a elaboração de um plano de contenção para a praga, que até o momento não existia. “Esta ação conta com a participação de engenheiros agrônomos associados a entidades filiadas à Confaeab”, finaliza o comunicado. 

Confira a íntegra da nota da Confaeab

 

Plano conjunto 
Na Argentina, especialistas e o Serviço Nacional de Saúde e Qualidade Agroalimentar da Argentina (Senasa) trabalham em um plano de gerenciamento e manejo. Por isso, emitiram alertas para os países vizinhos, com a finalidade de ser realizado um trabalho em conjunto com o Brasil, Paraguai e Bolívia. 

Contenção  
O controle desses gafanhotos deve ser preferencialmente realizado na fase jovem. Na etapa adulta, as aplicações de produtos devem ser realizadas quando não estão em movimento, como explica o eng. agr. PhD em entomologia que vem estudando o assunto Dori Edson Nava, do Núcleo de Fitossanidade da Embrapa Clima Temperado, unidade de pesquisas localizada em Pelotas (RS). "Em muitos casos se utiliza aviões agrícolas para aplicação dos produtos devido aos locais que os insetos ficam, normalmente em áreas de difícil acesso", comenta, lembrando que a aviação agrícola no país surgiu em Pelotas, em combate a uma nuvem de gafanhotos, da mesma espécie, vinda da Argentina, em 1947.

Segundo o pesquisador, todas as culturas de grãos (arroz, milho, soja, feijão) já foram colhidas no Rio Grande do Sul e o que há é o cultivo de cereais de inverno, onde as plantas ainda são pequenas. "Nosso grande problema seriam áreas de pastagens que são usadas para produção pecuária". O especialista descreve que o gafanhoto possui cerca de 400 hospedeiros e irá se alimentar de plantas cultivadas e nativas. "Ele não irá selecionar, ele irá atacar o que houver de material vegetal disponível, devido ao hábito voraz do inseto. A perda da pastagem ao que tudo indica será total no local onde os insetos pousarem", sinaliza. 

Dori Nava, eng. agr. PhD em entomologia e pesquisador da Embrapa (reprodução/UFPEL)

Fenômeno
Considerada um fenômeno natural, a nuvem de gafanhotos acontece de tempos em tempos. A história registra seis principais episódios: Egito (1400 a.C. e 2004), Estados Unidos (1874), México (2006), Israel (2013) e Leste da África (2019/2020).

Na América do Sul, o fenômeno surgiu em maio deste ano no Tchaco Argentino e parte da Bolívia, sendo monitorada pelas autoridades fitossanitárias, as quais observaram o aumento da população do gafanhoto. “Esse crescimento culminou em 2019. Como esse tipo de gafanhoto tem o hábito de se agregar, ele voa em grupos e formam essas nuvens. Provavelmente, o nível populacional desse inseto aumentou em função das condições climáticas favoráveis (altas temperaturas e pouca chuva, o suficiente para o crescimento das plantas que serviram de alimento). Assim, com uma grande quantidade de insetos, culminou com a falta de alimento e com as altas temperaturas, e ainda, as secas registradas nessa área, houve a necessidade deles migrarem em busca de alimento e condições para procriação, essa combinação de alta população, falta de alimento e condições climáticas favoráveis desencadeou o processo migratório”, esclarece o pesquisador da Embrapa Dori Edson Nava. 

Uma nuvem de apenas um quilômetro quadrado tem até 40 milhões de insetos que podem comer num único dia, o equivalente a 2 mil bovinos adultos. Isso porque possuem mandíbula robusta e conseguem consumir uma folha em segundos. A nuvem de gafanhotos da espécie Schistocerca cancellata pode voar até 150 quilômetros por dia. As fêmeas depositam no solo cerca de 60 a 120 ovos por ciclo. 

 

Julianna Curado 
Equipe de Comunicação do Confea
Com informações da Confaeab, Canal Rural, Embrapa, Ministério da Agricultura e Revista Galileu
Foto da capa na homepage: reprodução/ONU