Brasília, 8 de fevereiro de 2010.
Em maio de 2006, a Presidência da República publicou um decreto (Decreto nº 5.773/2006) cujo artigo 69 estabelece que docentes de qualquer área não mais precisam estar sujeito à inscrição em órgão de regulamentação profissional. Em dezembro do mesmo ano, o Confea publicou resolução (Resolução nº 1.018/2006) para tratar do registro de instituições de Ensino Superior. Em meio ao rol de exigências que a instituição tem que cumprir para poder se registrar no Sistema Confea/Crea, está a apresentação de relação de todos os profissionais docentes. Segundo a resolução, os professores que ministrem disciplinas profissionalizantes de áreas de formação abrangidas pelo Sistema devem estar adimplentes com suas anuidades junto ao Crea.
Desde então, a contradição entre o decreto presidencial e a resolução do Confea suscita debates em eventos do Sistema Confea/Crea. Entre esses eventos, está o 6º Congresso Nacional de Profissionais, que aconteceu em 2007 no Rio de Janeiro. Uma das propostas do 6º CNP trata do assunto e sugere que o Confea elabore um Projeto de Lei que determine aos professores de Engenharia, Arquitetura e Agronomia se registrarem, obrigatoriamente, nos Conselhos Regionais.
No lugar do Projeto de Lei proposto, a Procuradoria Jurídica do Confea irá ajuizar uma Ação Declaratória de Ilegalidade contra o artigo 69 do Decreto nº 5773/2006 perante a Justiça Federal. Um dos argumentos que embasa a defesa do Confea é o de que o Decreto nº 5.773/2006, que estabelece a não obrigatoriedade do registro de docentes, é uma norma de hierarquia inferior à Lei nº 5.194/1966, que regulamenta as profissões de Engenharia, Arquitetura e Agronomia. Segundo esse normativo, as atividades de ensino, pesquisa, experimentação, ensaio, estudo, projeto, análise, avaliação, etc fazem parte das atribuições profissionais dos engenheiros, arquitetos, agrônomos, etc. Ou seja, pela interpretação dessa lei, o engenheiro, arquiteto ou agrônomo que leciona em universidades está exercendo a profissão tanto quanto o profissional que trabalha em empresa, elabora projetos, presta consultoria, etc.
“A atividade de ensino é uma atividade profissional. Quando o profissional é contratado para ser professor em uma universidade, o edital o contrata como um engenheiro, arquiteto, agrônomo, etc. Por esse fato, entendo que os docentes devam se registrar no Sistema”, defende Francisco do Vale, conselheiro federal coordenador da Comissão de Ensino e Atribuição Profissional. “No entanto, a maioria dos professores entende que eles não têm essa obrigatoriedade por não atuarem no mercado de trabalho junto com outros profissionais”, completa.
Embora registrada no Crea “por ideologia” e com as anuidades em dia, a arquiteta e professora da Universidade de Brasília (UnB) Cláudia Amorim não discorda dos colegas docentes que optam por não se registrar. “O Crea fiscaliza projeto e obra. Do meu ponto de vista, isso não tem a ver com o professor. O Crea não fiscaliza universidades, ensino”, afirma. No entanto, a Lei nº 5.194/66 contradiz a docente. Segundo o normativo, os Conselhos Regionais são órgãos de fiscalização do exercício de profissões de Engenharia, Arquitetura e Agronomia e, ainda segundo a mesma lei, as atividades de ensino e pesquisa são, sim, atribuições profissionais, ou seja, estão sujeitas à fiscalização dos Creas. No entanto, a arquiteta mantém sua opinião. “Acredito que se o professor é dedicação exclusiva, se realmente não atua na área de projeto, não faz sentido pagar anuidade, pois será um registro com deveres e direitos que ele não vai usar”, diz.
O também professor da UnB, de engenharia civil e ambiental, Paulo César Marques explica alguns casos que fazem com que o registro de docentes no Sistema Confea/Crea gere antagonismos. “Por exemplo, no nosso curso, temos a disciplina ‘Avaliação Econômica de Projetos’. Quem ministra essa aula é um economista. Mas ele é docente de um curso de engenharia. Então como fazer?”, questiona. A Resolução nº 1.018/2006 responde: o Sistema Confea/Crea exige registro e adimplência somente dos docentes que ministrem disciplinas profissionalizantes de áreas de formação abrangidas pelo Sistema Confea/Crea, ou seja, não seria necessário o registro de um economista.
Outro exemplo citado por César Marques é quando um professor é capacitado para ministrar aulas, mas não é brasileiro, ou seja, não tem visto e registro brasileiros. No entanto, o conselheiro federal Francisco do Vale explica que os professores estrangeiros devem, sim, ter registro no Sistema. “Assim como qualquer profissional estrangeiro atuante no Brasil, os docentes que vêm de outros países também têm que ter seu diploma reconhecido, com tradução juramentada, enfim, passar por todo o trâmite de registro de profissional estrangeiro”, afirma.
Na opinião do docente César Marques, um professor que presta consultoria deve ter o registro. “Mas não creio que quem seja exclusivamente do campo acadêmico deva pagar anuidade”, diz. O professor fez, ainda, um paralelo com os advogados, profissão na qual “o advogado que não tem OAB não pode advogar, mas pode ser um excelente jurista”. Na opinião do advogado e procurador jurídico do Confea, João de Carvalho, o exemplo é legal, mas não é correto. “Na área do Direito você pode não ter OAB e realizar uma infinidade de atividades que não requeiram sua inscrição, tais como prestar concurso público para analista, juiz, promotor, ser assessor de ministro, etc. A única coisa que você não pode fazer é advogar. Já no âmbito do Sistema Confea/Crea, qualquer atividade demanda ART, seja de projeto, execução ou mesmo de cargo e função”, defendeu.
Para o conselheiro federal coordenador da Comissão de Educação e Atribuição Profissional, Francisco do Vale, um mecanismo que o Sistema Confea/Crea tem que buscar para sanar essa discrepância é a aproximação entre o sistema educacional e profissional. “Isso paralelamente ao trabalho da Procuradoria Jurídica do Confea, que averigua a melhor forma de tratar juridicamente a questão”.
Beatriz Leal
Assessoria de Comunicação do Confea