Trânsito profissional ainda gera divergências no Mercosul

Brasília (DF), terça-feira, 27 de abril de 2004.


A disparidade entre as legislações que regulamentam
"Integrantes da Mesa Redonda"
o exercício das engenharias e entidades representativas ainda são o maior entrave para o trânsito de serviços destas áreas nos países membros do Mercosul. O assunto, ainda longe de um consenso, foi debatido no segundo dia de atividades do workshop do Programa de Modernização e Valorização das Engenharias (Promove), organizado pela Associação Brasileira de Ensino em Engenharia (Abenge) em Brasília.

Participaram da mesa redonda representantes de órgãos profissionais e universidades dos quatro integrantes do bloco, Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. Cada um deles explicou a regulamentação profissional de seu país e defendeu posições sobre o cenário internacional e expectativas para o Mercosul.

Segundo o representante brasileiro na mesa, eng. civil Wilson Lang, presidente do Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (Confea), a incompatibilidade das legislações nos países do bloco torna as negociações complicadas. Para ele, uma das dificuldades está na falta de clareza sobre quem efetivamente fica encarregado de discutir e deliberar. "Os quatro países têm normas bastante assimétricas, com várias esferas regulamentadoras distintas. Então, todos acabam tendo que se reportar a muitos órgãos para que se chegue a qualquer conclusão, por mais simples que seja", reclama Lang.

Na Argentina, por exemplo, não há uma entidade que centralize as discussões: cada província tem um sistema diferente e muitas vezes as especialidades também se agrupam de maneiras diversas. "Trata-se de um fator complicador", reconhece o engenheiro argentino Héctor Raúl Rodríguez, membro de um dos 24 órgãos colegiados que regulamentam a engenharia civil no país. "Na Argentina, as províncias têm regimentos próprios, que muitas vezes têm de ser adequados a outros específicos para cada ramo da engenharia", explica.

Programa universitário - O problema, no entanto, vai além das diferentes formas institucionais de controle sobre a profissão. Ainda há o debate sobre como equalizar e certificar o profissional que pretende trabalhar fora de seu país, em outro membro do Mercosul. Para Lang, a saída seria um sistema de certificação da qualidade profissional encampado pelo conselho responsável nos respectivos países. "Estamos, no Brasil, rumando para um modelo de avaliação que garanta a qualificação do profissional egresso da graduação", argumenta. Ou seja, para exercer a profissão, o engenheiro precisaria ser avaliado e aprovado pelo Sistema Confea/Crea, por meio de prova ou de convênios com instituições de ensino certificadas pelo conselho, forma que ainda está sendo construída.

Nem todos, porém, concordam com o brasileiro. A engenheira María Teresa Piño Rodriguez, professora da Universidade Nacional de Assunção, no Paraguai, acredita que a pedra fundamental para o trânsito livre de engenheiros no Mercosul está justamente na adequação de programas, currículos e títulos acadêmicos. "Organismos profissionais devem ser responsáveis pela fiscalização e aplicação de normas. A qualidade da formação é responsabilidade da universidade", afirma.

A opinião é compartilhada pela engenheira María Simon, diretora da Faculdade de Engenharia da Universidade da República, no Uruguai. "A universidade é o começo de tudo, é quem realmente faz do aluno um profissional. Portanto, o processo de equiparação de qualidade deve começar ali", diz. Ela, que vem de um país sem conselhos profissionais, ressalta: "não podemos, porém, ficar restritos aos programas. É a universidade em si o foco da questão, porque com um mesmo programa, com um único currículo, podemos formar profissionais excelentes e outros péssimos", arremata.

Embora ainda haja muita divergência, engenharia é um dos campos com maiores avanços na discussão sobre a mobilidade de serviços no Mercosul. Hoje, as delegações dos países membros já aprovaram 32 resoluções para áreas de engenharia e tecnologia. Uma delas, que diz respeito ao trânsito profissional temporário, foi adotada pelos governos dos países do bloco como parâmetro para outros serviços e esta atualmente vigente.

Gustavo Schor - Da equipe da ACOM