FSM na Índia é importante intercâmbio para os povos latinos, diz Ministro Olívio Dutra

Mumbai (Índia), sábado, 17 de janeiro de 2004.

Começou no dia 16 de janeiro, às 16h00 (07h30 de Brasília) em Mumbai, na Índia, o IV Fórum Social Mundial (FSM) reunindo cerca de 100 mil participantes, dos quais 10 mil são de outros países, entre eles brasileiros representantes de Organizações Não Governamentais (ONGs), sindicatos, entidades profissionais, parlamentares e estudantes. O Governo brasileiro está sendo representado no evento pelo ministro das Cidades, Olívio Dutra, que falou com exclusividade à Assessoria de Comunicação do Confea sobre suas expectativas com relação ao Fórum, que no próximo ano deve retornar ao Brasil.

Confea - O Brasil hospedou o FSM nas suas três primeiras versões, cuja primeira o ministro, então governador do Rio Grande do Sul, foi anfitrião. Na sua avaliação o que podemos esperar da realização do Fórum aqui na Índia? Poderemos ter uma mudança na pauta de discussão?

Olívio Dutra - Sendo essa quarta edição realizada aqui na Índia, evidentemente que devem predominar temas relacionados a este continente e as suas lutas, mais que estão relacionados também com as lutas sociais globais. Percebermos que predomina também a presença dos povos asiáticos na sua multiplicidade e diversidade. E esse encontro, este intercâmbio é muito bom para os latino americanos e para os povos dos outros continentes.

Penso que trabalhar os temas dessas etnias e das formas engessadas que impedem a mobilidade social aqui ou ali, em diferentes cantos do mundo não só é importante como necessário. Podemos destacar neste FSM uma presença enorme das mulheres, e que não é passiva, mas sim, efetivamente, ativa.

Dessa forma, está claro que a cada edição do Fórum há agregação de novos temas e aprofundamento de temas anteriores. Isto é um desafio, que possibilita que o Fórum intervenha cada vez mais na conjuntura global, e possa ter uma agenda mais operativa, a ser debatida pelo Comitê Internacional do Fórum - constituído pelas entidades não governamentais - e com os comitês nacionais. Essa discussão, inclusive, já está começando a acontecer.

Este Fórum está mostrando a enorme importância que tem essa oportunidade que a humanidade está tendo de vislumbrar e preparar uma caminhada que construa um mundo de justiça, de igualdade, fraternidade, de paz, de relação holística do homem com a natureza e, fundamentalmente, de respeito aos direitos humanos, de fim da discriminação, das desigualdades. Acho que este evento a cada ano cresce em importância.

Confea - Mumbai tem cerca de 16 milhões de habitantes, é considerada uma das mega cidades da Índia - talvez possamos compará-la a brasileira São Paulo -, conta com uma série de problemas como por exemplo um trânsito caótico e ausência de saneamento básico. O Sr. acredita que o Brasil e Índia podem se ajudar no sentido de melhorar a qualidade de vida das suas cidades?

Olívio Dutra - Evidentemente que Índia e Brasil são os dois maiores países tropicais do mundo. Problemas que tem aqui na Índia temos lá no Brasil também, é claro, resguardando as devidas proporções. Temos um território maior do que a Índia e uma população bem menor. A população brasileira é de 170 milhões de habitantes, aqui são mais de um bilhão de indianos e o território é a metade do Brasil. Mumbai, por exemplo, é uma cidade que realmente pode ser comparada a São Paulo, tão conturbada quanto. Mas, em São Paulo temos 12 milhões de habitantes, aqui são 16 milhões. Há um problema sério no campo aqui na Índia e a agricultura tem um peso enorme, inclusive, nas atividades culturais e econômicas, geradoras de emprego. Este problema causa migração constante do campo para a cidade acentuando todos os problemas já existentes.

Há déficit habitacional tanto na área rural como urbana, porém muito maior na área rural, diferente do Brasil. Na questão de transporte, todos os visitantes participantes do Fórum já devem ter percebido o problema sério. Tem táxi que o carro tem mais de trinta anos, nenhuma sinalização, uso constante da buzina, o pedestre não tem vez, porém com tudo isso há poucos registros de acidentes. Eu mesmo não vi nenhum desde que cheguei e tenho andado bastante. Parece que há é uma anarquia com certa organização por conta da cultura do povo, que é pacífico, meditativo, não é de rompantes. Isso tudo deve ser levado em conta.

É claro que problemas graves de falta de saneamento, de moradia, dos transportes urbanos tornam o espaço urbano um espaço de sofrimento, mas nós não temos que achar que temos o melhor, nós queremos estar melhor, é diferente. A Índia, o Brasil e todos os países do terceiro mundo tem essa oportunidade na medida em que se encontram com frequência e o Fórum Social Mundial é o espaço, o momento para isso além de outras oportunidades que os governos têm que realizar.

Nesse sentido, o companheiro Lula está chegando aqui na Índia dia 24 para tocar adiante uma relação de intercâmbio, de integração, de fortalecimento, das possibilidades dos nossos países se ajudarem.

A proposta brasileira é de um G3 (Índia, Brasil e África do Sul) para discutir temas importantes e de interesse comum como moradia, saneamento, além de outros. Intensificar relações comerciais e fortalecer o intercâmbio científico, tecnológico e cultural. Enfim, não só acredito que este países podem se ajudar, como devem e vão fazê-lo, mas respeitando, é claro, a soberania de cada um.

Confea - O Sr. acha que a experiência brasileira da Conferência das Cidades, que abriu uma expectativa muito grande de entendimento e de soluções dos problemas urbanos, pode ser aplicada aqui na Índia?

Olívio Dutra - O processo da Conferência das Cidades no Brasil foi rico, importante e inaugural de um novo tempo de cidadania e de protagonismo do povo brasileiro para a temática urbana. Mas eu não estou aqui para dizer que essa experiência já é definitiva ou que ela pode ser um bom exemplo para outros países. Acho que aqui mesmo na Índia devem existir experiências ricas locais ou regionais de protagonismo do povo indiano para as temáticas urbanas. Nós também viemos aqui para aprender.

Bety Rita Ramos
Da equipe da ACOM