Dilemas sobre políticas para inclusão digital movimentam seminário internacional

"Somos um país em que boa parte da população é de baixa ou baixíssima renda. É preciso, então, pensar novas formas para fazer chegar a tecnologia digital a essa camada da sociedade", afirmou o secretário de Logística e Tecnologia da Informação do Governo Federal, Rogério Santanna dos Santos. Conforme disse, 90% dos acessos à Internet, hoje, são da classe A e B, o que prova que o abismo social é retratado também pelo prisma da inclusão digital.

"Não há como mudar isso sem definir prioridades e estabelecer uma política forte para disseminar a tecnologia da informação entre a parcela pobre da sociedade", lembrou o secretário. Medidas como a reciclagem de computadores, o subsídio governamental à compra destas máquinas a preços acessíveis e o compartilhamento de capacidades para utilização de hardware e software são ações urgentes segundo ele. "Se temos recursos escassos nessa área, precisamos ser criativos, aproveitá-los ao máximo e multiplicá-los", reforçou. Dentre as propostas de Santos, estão um incentivo às conexões rápidas das universidades brasileiras e a formação de professores como difusores da nova tecnologia. "Necessitamos, realmente, de uma política maciça de distribuição de computadores, pulverização dos conhecimentos sobre tecnologias da informação e capacitação", resumiu.

O diretor de regulamentação da Telefônica do Brasil, Wagner Heibel, acredita que um bom parâmetro para o início da política na área de inclusão digital é o modelo das telecomunicações. "A planta da telefonia fixa de São Paulo, por exemplo, dobrou de 1998 para cá. Hoje, paga-se R$ 70 para ter uma linha, quando naquele ano, quem queria telefone fixo precisava dispor de US$ 1 mil", lembrou. Isso, conforme Heibel, aconteceu por conta de uma modelagem do setor, com o estabelecimento de regulamentação, estabilidade de regras e oportunidades de investimento atraentes. "Se o investidor sentir-se seguro e estimulado, ele poderá trazer capital de longo prazo para as tecnologias digitais, assim como na área de telecomunicações",contou.

Outro lado do mundo - Heibel trouxe um exemplo de sucesso. A Coréia do Sul, país em desenvolvimento, mas que hoje é líder mundial em acessos de banda larga. Lá, 54% das residências estão aptas a conexões via banda larga, frente aos 24% no Canadá e 14% nos Estados Unidos. "O porquê é simples: governo e sociedade entenderam que a inclusão digital é um instrumento de desenvolvimento", afirmou o diretor da Telefônica. O poder público fomentou as condições administrativas e jurídicas para isso, deu subsídios da ordem de US$ 2,5 bilhões ao setor e apoximou-se da iniciativa privada para implementar ações.

Para ele, no caso do Brasil, a grande barreira é ainda o preço dos computadores. "Assim como a telefonia, a etapa dos preços é a fundamental. Depois de superada, fica mais simples instaurar políticas eficientes", argumentou. Temos, segundo Heibel, espaço para o desenvolvimento, a banda larga está consolidada e não há entraves culturais para a disseminação das novas tecnologias.

Comer primeiro - Enérgico, o vice-presidente da Associação Latino-Americana de Engenharia de Segurança do Trabalho, Cezar Benoliel, disse estar "cético" e não acreditar em soluções para inclusão neste momento. "Como podemos falar em inclusão digital se ainda convivemos com trabalho escravo, trabalho infantil e exploração sexual?!" Ele lembrou que, no mundo, apenas 13% da população tem acesso às tecnologias da informação e que isso reflete o profundo caos social dos dias atuais. "Eu não vejo saída. Pelo menos agora. Resolvamos antes nossos problemas básicos. Primeiro, façamos com que o povo possa se alimentar direito."

Gustavo Schor - da equipe da ACOM